O Rio e suas temporalidades
Você vai pedir a pizza na pizzaria. Não passam cartão e pedem para esperar o motoboy com o troco. Mas claro, cabe a você confiar se o motoboy vai chegar logo e se haverá troco.
No Brasil no qual dizem que o liberalismo está na moda, é tudo por sua conta e risco, e claro, uns 90% de outras coisas não contabilizadas, como o jeitinho brasileiro. Aquilo que Darcy Ribeiro chamava de "cunhadismo", Sérgio Buarque de "homem cordial" e "aventureiro", DaMatta de "você sabe com quem está falando?". É um liberalismo de autoridades, bastidores e privilégios. O brasileiro liberal é aquele de Carlos Augusto Taunay, do Manual do Agricultor Brasileiro, que ao mesmo tempo pregava liberdade econômica e economia escravocrata.
Então você desiste, sai da pizzria e vai pedir um sanduíche. A atendente cumprimenta você, diz que está sumido. Parece simpática! Mas não te atende e... sai da tua frente para espremer um suco.
De saco cheio, você escolhe não ser mais servido pelo comércio tão valioso, tão especial, no qual a laranja vale mais do que um novo cliente. Então você sai caminhar, dar uma volta e pensar como tudo aquilo é tão maluco. Passa de volta na pizzaria e pergunta de novo.
O motoboy ainda não chegou.
Eis o glorioso Rio de Janeiro. O de Garotinho, Paes e Romário disputando eleição. Com as milícias aplaudindo seu candidato a senador - Bolsonaro -, o mesmo que o sul do Brasil compra como "honesto".
É o mesmo Rio no qual as pessoas caminham na rua como se estivessem sozinhas, ou dirigem como se não existissem outros carros na rua. Um grita no telefone acusando o "parceiro" que quebrou sua confiança. As duas sentam no café para falar alto da gravidez infiel e onde tudo aquilo vai dar. A dona me tranca a passagem na rua com seus cachorrinhos. Na pizzaria, o policial falava sobre favelas, tiros e adrenalina.
Nelson Rodrigues, Antonio Prata e tantos outros já haviam falado de tais coisas.
Volto a pensar na moda liberal, na proposta de armar o povo e tantas outras coisas meio estranhas. O vizinho que odeia corrupção diz, num outro lance, que apenas conversa certas coisas em reservado. Lobby, queria dizer.
Amanhã, domingo, é dia de churrasco, o que significa que também é dia de gente bêbada na rua, agressões e ameaças de morte. Não estou falando de jornal, mas de cotidiano. "Acidentes".
Agora, imagine tanta gente "livre" assim e armada. Ops, esqueci: elas já andam armadas. Arrisque mexer com alguém.
Então chego em casa, pensando: enfim um refúgio! Entro no elevador e encontro regras de convivência do tipo: antes de entrar, aguarde que o outro saia.
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