Natal


Em meio aos pensamentos sobre esse blog solitário (quem faz um blog em 2018?), estava organizando as postagens, e nem percebi que havia colocado uma postagem totalmente impessoal para o Natal.

Não perceber que se está perto do Natal é um sinal dos tempos. Muito ruim, por sinal.

Não importa muito no que você acredita. Natal é natal. Se você não acredita na substância cristã do natal, ao menos deveria acreditar que as pessoas acreditam em muitas coisas.

Sim, é certo que há quem acredite que para elas Jesus sobe numa goiabeira diante dos olhos, crença cujo ridículo só não ultrapasse as crenças pré-científicas de que andar armado garante a segurança ou de que a Terra é plana.

Mas refiro-me a outro tipo de crença: ao fato de que já tivemos inúmeras cosmologias, cristãs ou não-cristãs. Inclusive, o próprio cristianismo nunca teve a mesma cosmologia. O Mundo não é o mesmo e nunca o foi, mesmo para o cristão mais convicto (Lemaître, Descartes, São Tomás e Santo Agostinho que me desmintam). E que bom que é assim.

Por isso, o mundo seria mais bonito se pudesse contemplar tantos outros Mundos. É meio errado, assim, defender que o feriado cristão "não vale" ou deveria ser deposto. É como se estivéssemos em direção de um mundo único, cinza, unicamente voltado aos turnos do trabalhho.

Muito mais bonito seria defender que outros feriados, de tantas outras convicções, pudessem multiplicar.

Por isso, desejo a você, do mais fundo do meu coração, um Mundo maior e um  Feliz Natal.

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Bolsonaro: economia de ministérios = questões fora de vista

Onix Lorenzoni divulgou hoje (embora nada se possa confiar nesse governo) que os ministérios seriam reduzidos de 29 para 22.

O que me parece interessante é que esse dado não é o menos importante (FHC já havia dito certeiramente que “não interessa o que Bolsonaro diz, mas o que vai fazer. Esperemos a posse“), e sim o que ali não está contido.

Meio Ambiente e Direitos Humanos permanecem sem nomes, visto que Bolsonaro tornou esses ministérios "polêmicos" (como se não fosse simples bom senso mantê-los).

Mas há mais coisas aí sem nome. Uma delas é a quase ausente reação dos diversos setores da educação contra o nome do ministro escolhido. Houve algum burburinho, mas nada comparável ao que ocorreu quando Bolsonaro ameaçou fundir o meio ambiente com a agricultura.

A educação, pelo visto, vai bem (mesmo que bem desunida).

O mesmo ocorre com o Ministério do Trabalho. Será simplesmente desmembrado. E o setor responsável pelo trabalho escravo não tem destinação precisa.

O trabalho escravo continua vivinho no Brasil, em qualquer lugar e cenário. E o combate contra ele já sofria cortes orçamentários.

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Lá nas terras de Moçambique, Mia Couto diz:
“A pressa em mostrar que não se é pobre é, em si mesma, um atestado de pobreza. A nossa pobreza não pode ser motivo de ocultação. Quem deve sentir vergonha não é o pobre mas quem cria pobreza.
A frase explica muita coisa, não sobre Moçambique mas sobre o Brasil. O irônico é que apenas seja proferida lá, e não aqui. Por aqui, parece que as pessoas acham que ostentar a riqueza que não se tem é algo normal. Uma sociedade inteira com sucata nos pés e ouro na cabeça.

Talvez os moçambicanos ainda tenham chance.

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Bolsonaro e a doutrinação do ENEM

Bolsonaro disse ontem, a respeito do ENEM:
Esta prova do Enem – vão falar que eu estou implicando, pelo amor de Deus –, este tema da linguagem particular daquelas pessoas, o que temos a ver com isso, meu Deus do céu? Quando a gente vai ver a tradução daquelas palavras, um absurdo, um absurdo! Vai obrigar a molecada a se interessar por isso agora para o Enem do ano que vem?
, e depois arrematou:
Podem ter certeza e ficar tranquilos. Não vai ter questão desta forma ano que vem, porque nós vamos tomar conhecimento da prova antes. Não vai ter isso daí 
 Suas teses estão bem claras: segundo ele, há uma conspiração esquerdista no ENEM, com questões focadas em gênero para os jovens "se interessarem" em coisas do tipo.

Será isso mesmo? Vamos à questão do ENEM:
Conforme divulga o link, a resposta correta é a "C".

Agora vale prestar atenção e responder ao seguinte: estamos diante de uma questão sobre LGBT ou sobre língua portuguesa, envolvendo a definição de dialeto e uma pequena dose de interpretação de texto

Os bolsonaristas poderiam, nisso, responder: mas por que então escolher um dialeto gay? Não haveriam outros dialetos, igualmente minoritários?

A resposta óbvia é: se há tantos dialetos e minoritários, que diferença faz numa questão de língua portuguesa? Há tanta utilidade em escolher um quanto outro.

Pegou mal para Bolsonaro... Em primeiro lugar, porque ele simplesmente não leu a questão. Em segundo, sendo uma questão sobre dialetos, por que alguém proibiria um dialeto em detrimento dos outros?

O critério da prova não deveria ser neutro? O estudo da língua, como poderia dizer Bolsonaro, não deveria ser "neutro"? Afinal, é uma prova de português!

A respeito disso, Eduardo Bolsonaro comentou em seu twitter:
Prezados estudantes, quando vocês forem ser entrevistados para um emprego ou estiverem abrindo um empreendimento aviso: sexualidade, feminismo, linguagem travesti, machismo e etc terão pouca ou nenhuma importância. Portanto, estude também o que lhe deixará apto para a vida.
Olhem a tese: é preciso conhecimentos para se estar "apto à vida", e não essa coisa de aprender coisas de sexualidade. Em certo sentido, quem discordaria dele? Nem o criador da prova do ENEM! Ele poderia inclusive complementar que é essencial para a vida a interpretação de texto.

Tem faltado professor aí... pois, além de interpretação de texto, faltou no texto de Bolsonaro também outras coisas, como concordância, eliminação de verbos excessivos e gerundismos. 

***
De todo modo, ocorre aí algo muito grave. 

Entendemos que os Bolsonaro estão errados e a "doutrinação do ENEM" é uma mentira. Mas algo aí não passou como mentira, e é o próprio episódio. 

Hoje foi o episódio do ENEM, ontem o das "mamadeiras de pinto", anteontem o do manual de doutrinação do MEC...

Todos os episódios se comprovam como mentirosos. Mas algo permanece: a pauta. Já é um ensinamento antigo que uma mentira repetida muitas vezes torna-se verdade. Não à toa, os professores estão sofrendo tantos constrangimentos.

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Haddad, Bolsonaro, JN e retórica.

Hoje o Jornal Nacional realizou entrevista com Haddad, após a indicação de Lula e a pesquisa do Datafolha que mostrou Bolsonaro - "esfaqueado" - com 26% e Haddad com 13%, empatado em segundo com Ciro Gomes (PDT).

De algum modo, o JN empregou uma retórica ainda não vista n'outros anos na entrevista com candidatos: a do combate. Na ocasião de Bolsonaro, ele chegou a comparar a mesa de debate com um módulo de artilharia.

No que diz respeito a Haddad, ele foi "metralhado" (se utilizarmos outra palavra de Bolsonaro sobre petistas) por Bonner e Vasconcellos, ou ao menos essa foi a impressão retórica da entrevista para o cidadão em geral.

Tais aspectos mostram bem a época na qual vivemos. O formato inteiro - de "artilharia" - favoreceu Bolsonaro, candidato de retórica fraca e palavras secas, que ainda não superou as fases operatório-concretas do desenvolvimento infantil. Da entrevista dele para cá, o candidato teve inclusive reuniões com os diretores da Globo (dois dias antes da facada), o que mostra que o grupo levou sua candidatura mais a sério.

Quanto a Haddad, o tom professoral não sobreviveu aos ataques de Bonner e Vasconcellos. Independente do que Haddad tenha feito ou não como político, no nível da argumentação seu posicionamento de professor não é o formato ideal da entrevista. Pois Haddad se concentrava primeiro em contextualizar a pergunta de Bonner, para depois respondê-la. Não conseguiu falar e foi bombardeado com outras perguntas e evidências (verdadeiras ou não).

Veja bem, caro leitor: não defendi Haddad em momento algum. Mas é curioso: uma época "da lacração" exige posicionamentos "lacradores". Não à toa o "mito" está em primeiro nas pesquisas. Não precisa dizer uma só palavra ou articular argumento, num evento que ainda ousam chamar de político.

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Um museu não queima à toa


No dia 2 de setembro, data em que Maria Leopoldina assinou a independência do Brasil, o Museu Nacional - local da assinatura - ardeu em chamas. Nada mais simbólico.

Pouco sobrou. Conforme comentou Eduardo Viveiros de Castro, um dos maiores antropólogos da atualidade, o que ardeu foi o "ground zero" do pensamento brasileiro. O ponto inicial do que poderia nos dar alguma identidade nacional, e não apenas a face de um país que não sabe para onde vai.

Nas redes sociais, vejo as pessoas se emocionarem. Mas logo continuam as correntes, os memes, inclusive em prol de candidatos sem qualquer proposta para a cultura. Ou mesmo em apoio a um candidato fascista.

É o mesmo candidato fascista que disse várias vezes que vai "fuzilar" o pessoal da cultura e anexar o Ministério da Cultura como modesta secretaria dentro do Ministério da Educação. Quem seria o encarregado? Alexandre Frota (quando a coisa aperta, vem alguém para dizer: "foi 'brincadeira'"). Mas o engraçado é que as pessoas são capazes de chorar pelo Museu Nacional e não ligar essa informação ao fato que o próprio candidato de seu voto rebaixará o ministério da Cultura.

A entrevista com Eduardo Viveiros de Castro, antropólogo do MN, emociona e revolta. É uma triste e pessimista análise sobre o que o Brasil está se tornando.

O brasileiro é ruim de ouvido, não sabe ouvir críticas. Crítica interna é coisa de chato e caxias. Quanto à crítica externa, ela só vale se for em sinal de reconhecimento. Se for negativa, os auto-enganos e justificações são bastante automáticos.

Então as declarações do arqueólogo egípcio Zahi Hawass passarão por nós como se não existissem (isso para quem as ler). Ele disse que, se não somos capazes de cuidar das raridades egípcias que perduraram outros 3500 anos, deveríamos então devolvê-las, ao invés de deixá-las arder. Afinal, se o descuidado é um patrimônio brasileiro, isso não quer dizer que outros países gostem do mesmo.

Um pouco desorientado, copio o link da entrevista com Viveiros de Castro e faço circular nas redes sociais. Mas logo alguém me interrompe sobre essas coisas de "ficar divulgando "links do PT". Diz ele: isso não passa de propaganda ideológica, coisa de esquerda, de intelectuais, de "gente da cultura" etc.. "Querem nos enganar, agora sobre o Museu".

Mas não havia ali nada referente ao PT. "PT" se referia ao endereço do site que entrevistou Viveiros de Castro. No caso, era o jornal "Publico", de Portugal, cujo endereço é publico.pt .

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Noam Chomsky, as fake news e o Brasil


O quanto essa entrevista com Noam Chomsky nos cabe.

Sobre a descrença nos "fatos" e a criação de um mundo de fakenews, ele diz:
Já faz 40 anos que o neoliberalismo, liderado por Ronald Reagan e Margaret Thatcher, assaltou o mundo. E isso teve um efeito. A concentração aguda de riqueza em mãos privadas veio acompanhada de uma perda do poder da população geral. As pessoas se sentem menos representadas e levam uma vida precária, com trabalhos cada vez piores. O resultado é uma mistura de aborrecimento, medo e escapismo. Já não se confia nem nos próprios fatos. Há quem chama isso de populismo, mas na verdade é descrédito das instituições.
 Sobre como a imprensa concede pauta para atitudes não-democráticas:
Olhe a televisão e as primeiras páginas dos jornais. Não há nada mais que Trump, Trump, Trump. A mídia caiu na estratégia traçada por Trump. Todo dia ele lhes dá um estímulo ou uma mentira para se manter sob os holofotes e ser o centro da atenção. Enquanto isso, o flanco selvagem dos republicanos vai desenvolvendo sua política de extrema direita, cortando direitos dos trabalhadores e abandonando a luta contra a mudança climática, que é precisamente aquilo que pode acabar com todos nós.
O texto acima é particularmente interessante, devido a um fenômeno talvez pouco estudado, mas que a linguagem popular chama de "dar bandeira a maluco". Por controle de estímulos, como dizem os psicólogos behavioristas (isto é, pela criação sucessiva de contextos nos quais determinados eventos são apresentados e ocasionam determinados jogos - contingências - de comportamento), uma pauta anti-democrática ganha primeiro plano no seio da democracia. Ou, em outras palavras, um candidato é capaz de ganhar visibilidade não pelo que diz ou tem a contribuir, mas pelo fato de tornar-se frequentemente visível por outros critérios. Um pouco como na velha frase atribuída a Goebbels.

Isso ocorre no já clássico caso da oposição Lula x Bolsonaro: quando a esquerda, por vício de alarmismo e vitimismo, colocou os dois lado a lado, isso acabou capitalizando a figura de Bolsonaro que, de deputado irrelevante do baixo clero, tornou-se uma espécie de "opositor" das políticas do PT.

O resultado tornou-se bastante conhecido ao brasileiro: basta dizer "Lula" que alguém devolve sem pensar "Bolsonaro!"; e basta acusar Bolsonaro e você é diretamente visto como "lulista", mesmo que isso esteja longe da verdade.
P. Houve um deslizamento para a direita do espectro político?
R. Na elite do espectro político sim, ocorreu esse deslizamento, mas não na população em geral. Desde os anos oitenta se vive uma ruptura entre o que as pessoas desejam e as políticas públicas. É fácil ver isso no caso dos impostos. As pesquisas mostram que a maioria quer impostos mais altos para os ricos. Mas isso nunca se leva a cabo. Frente a isso se promoveu a ideia de que reduzir impostos traz vantagens para todos e que o Estado é o inimigo. Mas quem se beneficia da reduzir [verbas para] estradas,hospitais, água limpa e ar respirável? 

P. Então o neoliberalismo triunfou? 
R. O neoliberalismo existe, mas só para os pobres. O mercado livre é para eles, não para nós. Essa é a história do capitalismo. As grandes corporações empreenderam a luta de classes, são autênticos marxistas, mas com os valores invertidos. Os princípios do livre mercado são ótimos para ser aplicados aos pobres, mas os muito ricos são protegidos. As grandes indústrias de energia recebem subvenções de centenas de milhões de dólares, a economia de alta tecnologia se beneficia das pesquisas públicas de décadas anteriores, as entidades financeiras obtêm ajuda maciça depois de afundar… Todas elas vivem com um seguro: são consideradas muito grandes para cair e são resgatadas se têm problemas. No fim das contas, os impostos servem para subvencionar essas entidades e com elas, os ricos e poderosos. Mas além disso se diz à população que o Estado é o problema e se reduz seu campo de ação. E o que ocorre? Seu espaço é ocupado pelo poder privado, e a tirania das grandes corporações fica cada vez maior.
Lúcido, o velho Chomsky.

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A verdadeira riqueza

A beleza e a verdadeira riqueza são sempre assim, baratas e despreparadas. O paraíso poderia ser definido como o lugar que os homens evitam.
- Thoreau, Maçãs Silvestres e Cores de Outono.

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Fim da CLT e terceirização irrestrita: um dia histórico (para a história do esquecimento)

Hoje é um dia histórico. O STF aprovou a contratação terceirizada sem restrições, exatamente um dia após Temer anunciar aumento de 16% ao STF.

Um dono de restaurante poderá terceirizar todos os funcionários, inclusive os de atividades-fim. Um diretor de escola poderá terceirizar todos os professores. E assim por diante, o emprego brasileiro tornou-se um arranjo de frangalhos.

A tese é de modernização e liberalização, desburocratizando leis "rígidas" e maleabilizando as iniciativas individuais. Diz o ministro Barroso:
Estamos vivendo a revolução tecnológica. Milhões de pessoas se intercomunicam pela Internet. Vivemos sob uma nova ideologia, nova gramática. Não há setor da economia que não tenha sido afetado

A aparência de modernização não esconde a facilidade em provar como tudo isso favorecerá a degradação de nossa malha trabalhista, com vínculos precários, instáveis, frutos de negociatas e jogos de lobby e privilégios, baixando o valor geral dos salários e a qualidade dos serviços. Sem contar o mito de que o numero de empregos aumentará.

A aposta é dupla: primeiro, a idéia de que se cada um for entregue a si mesmo, haverá uma "competição" na qual a qualidade dos serviços aumenta e apenas o "mais forte" e "competente" tem sucesso; e a idéia de que a sociedade de fato se beneficiaria como um todo, sistemicamente, com isso.

Moral da história: liberdade individual e benefício coletivo.



Mas é como se esquecêssemos de quem somos. Não muito tempo atrás, o brasileiro era simplesmente entregue ao próprio corpo e ações, sem maiores leis ou idéia de país a ampará-lo. Sempre fomos uma sociedade de eiras e beiras.

Darcy Ribeiro dizia: aqui não passava de um "moinho de gastar gente". Nada mais longe do que qualquer idéia de liberdade individual.

Mas enfim, quando criada a CLT, Getúlio Vargas a anunciou em alto e bom tom. Houve grandes consequências populares e nos jornais. As leis vigoraram por décadas.

Hoje, sob transformação tão importante, a notícia passou quase despercebida. Não chegou a ser preocupação nas ruas. Ninguém se importou com isso.

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Entrevista com Agnes Heller

Fui marxista durante uma época, mas desde então não quis nenhum ismo, nem mesmo o de anti-marxismo. É algo que aprendi com Michel Foucault, que nenhum filósofo pode aderir a um ismo. Estávamos juntos em Nova York e um jovem se aproximou de Foucault e perguntou: “Professor, você é estruturalista ou pós-estruturalista?”. E ele respondeu: “Sou Michel Foucault”. Nem todos os filósofos contemporâneos pertencem a escolas, tendências...

Bela entrevista com Agnes Heller, no El Pais. 

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O Rio e suas temporalidades


Você vai pedir a pizza na pizzaria. Não passam cartão e pedem para esperar o motoboy com o troco. Mas claro, cabe a você confiar se o motoboy vai chegar logo e se haverá troco.

No Brasil no qual dizem que o liberalismo está na moda, é tudo por sua conta e risco, e claro, uns 90% de outras coisas não contabilizadas, como o jeitinho brasileiro. Aquilo que Darcy Ribeiro chamava de "cunhadismo", Sérgio Buarque de "homem cordial" e "aventureiro", DaMatta de "você sabe com quem está falando?". É um liberalismo de autoridades, bastidores e privilégios. O brasileiro liberal é aquele de Carlos Augusto Taunay, do Manual do Agricultor Brasileiro, que ao mesmo tempo pregava liberdade econômica e economia escravocrata.

Então você desiste, sai da pizzria e vai pedir um sanduíche. A atendente cumprimenta você, diz que está sumido. Parece simpática! Mas não te atende e... sai da tua frente para espremer um suco.

De saco cheio, você escolhe não ser mais servido pelo comércio tão valioso, tão especial, no qual a laranja vale mais do que um novo cliente. Então você sai caminhar, dar uma volta e pensar como tudo aquilo é tão maluco. Passa de volta na pizzaria e pergunta de novo.

O motoboy ainda não chegou.

Eis o glorioso Rio de Janeiro. O de Garotinho, Paes e Romário disputando eleição. Com as milícias aplaudindo seu candidato a senador - Bolsonaro -, o mesmo que o sul do Brasil compra como "honesto".

É o mesmo Rio no qual as pessoas caminham na rua como se estivessem sozinhas, ou dirigem como se não existissem outros carros na rua. Um grita no telefone acusando o "parceiro" que quebrou sua confiança. As duas sentam no café para falar alto da gravidez infiel e onde tudo aquilo vai dar. A dona me tranca a passagem na rua com seus cachorrinhos. Na pizzaria, o policial falava sobre favelas, tiros e adrenalina.

Nelson Rodrigues, Antonio Prata e tantos outros já haviam falado de tais coisas.

Volto a pensar na moda liberal, na proposta de armar o povo e tantas outras coisas meio estranhas. O vizinho que odeia corrupção diz, num outro lance, que apenas conversa certas coisas em reservado. Lobby, queria dizer.

Amanhã, domingo, é dia de churrasco, o que significa que também é dia de gente bêbada na rua, agressões e ameaças de morte. Não estou falando de jornal, mas de cotidiano. "Acidentes".

Agora, imagine tanta gente "livre" assim e armada. Ops, esqueci: elas já andam armadas. Arrisque mexer com alguém.

Então chego em casa, pensando: enfim um refúgio! Entro no elevador e encontro regras de convivência do tipo: antes de entrar, aguarde que o outro saia.

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Sara - Henrique Cesar

Sara by Henrique Cesar on 500px.com


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Cartier-Bresson, 110 anos

Hoje, Cartier-Bresson faria 110 anos. É, definitivamente, o olhar do século XX.

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Como (não) criar seu filho


Muito preocupada, uma mãe pergunta numa rede social: o que dar para meu filho como alternativa aos produtos eletrônicos? Confesso que minhas opções acabaram e começo a ver a criança entediada, impaciente.

Em resposta, uma rede inteira de solidariedade se arma: ela poderia dar massinha, pintura, brinquedos, brincadeiras novas, combinar para sair com as amigas e seus filhos, "por que eu, com meu filho, faço..."

Os comentários vão proliferando, com inúmeras receitas mirabolantes. Mas dentre todas, algo chama a atenção: nenhuma expressão semelhante a "auto" e "por ele mesmo". Fica a mensagem do perigo a evitar: "tédio", "impaciência", "ansiedade".

Os comentários vão se acumulando como imensos blocos a preencher um buraco, um vazio. A mãe precisa saber, pois a criança não pode ficar sem ter o que fazer.

Aí recordo de minha infância. Quanto tempo largado ao tempo. Folhas viravam dinheiro, papel virava mapa, galho de árvore virava espada... Claro, os pais e parentes sempre foram importantes, mas salta aos olhos o tempo, tão grande, no qual eu, e tantos outros, ficamos por nós mesmos. Inclusive trocávamos as brincadeiras. Ah sim: os espaços também eram diferentes.

Parece que hoje não pode haver espaço em branco, lacuna, vazio. Mas ora, é nesses espaços que alguém desenvolve autocontrole, iniciativa e criatividade. O que vou fazer com esse tempo, diante desse vazio? Parece que as pessoas não podem mais se deparar com essa pergunta. Há sempre um gadget, um programa, um software, ou uma alternativa descolada que alguém tem que dar.

E assim criamos crianças cheias, sem qualquer espaço para o insuportável vazio. Mas surpreende, pois a vida também tem lacunas, inclusive para respirar, ponderar e criar. O que seria do salto sem o recuo? Mas não há tempo para isso.

E a vida, como fica quando alguém nunca aprendeu a se deparar com a própria finitude, com o próprio vazio?

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Estar embevecido de leitura, busca, saber


Hoje aconteceu comigo, mais uma vez, algo que parece cada vez mais raro. Recebo um e-mail de um professor, já aposentado, de duas gerações anteriores à minha, orientando-me sobre vários aspectos de meu estudo.

Eu havia apenas pedido uma olhadela num texto. Em troca, recebi indicações de contatos e uma resposta atenta, transbordante, convidativa. Daquelas respostas que fazem você se reencontrar com a própria ignorância e o desejo de busca.

Fico me perguntando sobre o que se passa hoje em dia. Em geral, esse tipo de resposta é visto de duas formas: ou como arrogância ou ameaça.

Em primeiro lugar, quem diz muito e faz transbordar o copo do saber, muitas vezes, coloca-se sob posição superior, do tipo "então quer dizer que você não sabe disso?"

Em segundo lugar, é cada vez mais frequente o que vejo em muitos estudantes: não fale o que eu não entendo! Isso me gera angústia.

Sinais dos tempos... Mas como é bom reviver um momento como aquele. Um grande brinde para meu professor distante e amigo, mesmo que eu nunca tenha sido seu aluno e não o conheça.

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As falas do fascista

Dentre os candidatos às eleições 2018, todos sabem que há um candidato fascista. Mais de uma vez, o brasileiro teve motivos para não votar nele. Por fascismo, defino: o culto a regimes de exceção (e contrários ao exercício da liberdade individual), a defesa de tortura patrocinada pelo Estado e de grupos de extermínio, declarações ofensivas e criminosas contra mulheres, negros e homossexuais, a defesa da violência como método de "segurança" e a acusação de "inimigos" que precisam ser exterminados, deletados, eliminados ou tirados do caminho (mas Umberto Eco tem uma definição muito mais contundente).

Não mencionei o apoio a milícias (como as cariocas), a aceitação de propina requentada pelo partido ou o cultivo de funcionário fantasma.

Há quem diga "ele não fala ou faz as coisas a sério". Mas se raio não cai no mesmo lugar, não é meio maluco vê-lo cometendo tantas "brincadeiras"? Sinceramente. 

Ou ainda, vou começar a recolher aqui algumas de suas falas, apenas as dos últimos dias.

2 de setembro: "Bolsonaro fala em 'fuzilar a petralhada' no Acre". Mas não é só: ele fala em expulsar a "petralhada" para a Venezuela, já que o Acre ficaria  "perto". À esquerda, dirão que a fala foi literal; à direita, dirão que foi figurada. A pergunta que fica é: e numa democracia, como se porta um candidato frente a seus adversários? Mas o mais curioso é achar que o Acre fica próximo à Venezuela (se 1000 Km representar proximdiade...)

24 de agosto: "Bolsonaro quer campo de refugiados em Roraima". Não tenho palavras para comentar inúmeras passagens.
Por que Roraima, por exemplo, está fadado ao fracasso? Por causa da política ambiental indigenista. Como atender à demanda para que esses bens sejam explorados agregando algum valor para atender às bancadas desses Estados? E assim a gente vai ponteando o Brasil todo.
Esse pessoal que defende direitos humanos de marginais, em grande parte, vive de dinheiro de ONGs. Não terá um centavo para ONG que defenda o direito de marginais. O marginal para mim é um bandido que só tem um direito para mim: o de não ter direito e ponto final.
O que eu falei foi que as bancadas de segurança, que é conhecida pela bancada da bala, vai aumentar e muito. Que a violência é o que tá cabeça de todo mundo como o primeiro assunto a se buscar uma solução para ele.
Ele (Trump) quer cérebros lá dentro. Os Estados Unidos, pelo que eu entendo, são uma fábrica de cérebros. E não pode, no meu entender – no lugar dele eu faria a mesma coisa – aceitar à vontade tudo quanto é tipo de gente. Porque junto com gente boa entra quem não presta. Olha a nossa querida Roraima, Boa Vista e Pacaraima. Eu estive lá. Hoje em dia calculam que Boa Vista tem em torno de 40 mil venezuelanos. E olha só, a ditadura, quando começa a tomar forma, a elite é a primeira a sair. Essa foi pra Miami. A parte mais intermediária, grande parte foi para o Chile. E agora os mais pobres estão vindo para o Brasil. Nós já temos problemas demais aqui. Se vamos incorporar aquele exército que recebe Bolsa Família, quem vai pagar isso aí? Vamos aumentar impostos?
Primeiro, via Parlamento, revogar essa lei de imigração aí. Outra, fazer campo de refugiados. 
23 de agosto: "Bolsonaro encoraja pais a ensinarem as crianças a atirar"
O candidato à Presidência pelo PSL, deputado federal Jair Bolsonaro (RJ), disse que ensinou os próprios filhos a atirar com arma de fogo, com munição, quando eles tinham cinco anos e afirmou que "encoraja, sim" esse tipo de conduta para evitar que haja uma geração de "covardes" na sociedade. "Não podemos mais ter uma geração de covardes, de ovelhas, morrendo nas mãos de bandidos sem reagir", afirmou em entrevista nesta quinta-feira (23), depois de participar de atos de campanha em Araçatuba e Glicério, no interior paulista. Ele criticou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e disse que esse conjunto de leis deve ser "rasgado e jogado na latrina".

"Defendo que um pai ensine o que é uma arma de fogo para seu filho, para que serve. Nas comunidades tem moleque usando fuzil maior do que ele. Não podemos criar uma geração de covardes, de submissos, partir para esse tipo de política, de sempre se entregue, não reaja"
No mesmo evento, ele declarou: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) "deveria ser jogado na latrina", pois "é um estímulo à vagabundagem e à malandragem infantil".

22 de agosto: Vídeo que lista condenações de Jair Bolsonaro não sofreu manipulação

21 de agosto: Bolsonaro vai à igreja como candidato e pode ser enquadrado por propaganda irregular.

20 de agosto: Filho de Bolsonaro aumenta patrimônio em 432% em 4 anos.

19 de agosto
Candidato à presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro explicou o que quis dizer a Marina Silva no debate de sexta-feira na RedeTV! sobre a bíblia pregar o armamento.
A declaração foi colhida pelo jornal O Globo.  Paulo fala: “venda suas capas e compre espadas”. Está na Bíblia”, declarou o presidenciável durante evento na Academia dos Agulhas Negras, em Resende (RJ).
Na verdade, um trecho semelhante ao citado por Bolsonaro está no livro de Lucas e não de Paulo.  Alertado pelo Globo sobre o erro, Bolsonaro minimizou: “Eu não lembro qual livro. Jesus Cristo não foi totalmente passivo. Expulsou os vendilhões do templo. Se tivesse arma de fogo, seria usada”, insistiu o deputado federal. (ele levou uma chapuletada de Marina Silva e de vários teólogos, inclusive com previsão de Julian Arias)

18 de agosto:
“Se eu for presidente, eu saio da ONU. Não serve para nada essa instituição”, disse Bolsonaro neste sábado (18), numa cerimônia de cadetes da Aman (Academia Militar das Agulhas Negras), em Resende (RJ).
“Saio fora, não serve para nada, é um local de reunião de comunistas e de gente que não tem o menor compromisso com a América do Sul”, disse após ser questionado pela Folha sobre adecisão favorável de um comitê da ONU pela candidatura do ex-presidente Lula. (18 de agosto - no dia 20 de agosto disse que foi "ato falho" e nunca havia dito isso...)



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